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A idiossincrasia do aprovado em concursos.
Comunica-se, no dia-a-dia, com um pequeno número de vocábulos. Prestigia-se o trivial; menospreza-se o sofisticado. Usam-se, de modo recorrente, palavras óbvias para situações não menos previsíveis, sem o conhecimento das possibilidades léxicas multifacetadas que nosso riquíssimo idioma pode ofertar.
A quantidade de vocábulos comuns se apequena, se levarmos em conta o número de palavras existentes em nosso idioma: 344.440 (trezentas e quarenta e quatro mil quatrocentas e quarenta) palavras, segundo o VOLP - o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, atualizado pela Academia Brasileira de Letras em 2004.
Como fazer para ampliar o conhecimento das palavras? A resposta é elementar: ao encontrar um termo de difícil significado, procure o sentido no dicionário e, se possível, escreva o que aprendeu, a fim de que se perpetue o resultado daquele sublime momento investigativo.
Costumo dizer em minhas aulas que o dicionário, quando consultado, "premia" o interessado, pois lhe apresenta um mundo vasto, repleto de sentidos, pelo caminho das palavras. O "visto" pra essa viagem depende de requisitos simples: "curiosidade" e "obstinação". A primeira é a "mola" que impulsiona o usuário da língua a querer saber mais; a segunda é a característica daquele que não sucumbe diante da palavra complicada. Aliás, o "obstinado" não substitui, comodamente, o termo esotérico, como o fazem os "substituístas" - denominação jocosa de que me valho para indicar os que, despidos de curiosidade, preferem substituir a palavra "hermética" a procurar o seu sentido no dicionário.
A propósito do conhecimento vocabular, as provas de concursos públicos têm solicitado o tema. Em exame para o ingresso na carreira do Ministério Público do Rio Grande do Sul, deparou o concursando com os seguintes vocábulos: OPIMO e ESTALIDO.
O termo opimo (paroxítona não acentuada, com sílaba tônica em -pi) significa "rico" ou "abundante". Diz-se "alma opima" ou "terra opima".
O vocábulo estalido (paroxítona não acentuada, com sílaba tônica em -li) significa "barulho" ou "som". Pode-se, por exemplo, ouvir um "estalido de fogos de artifício".
Igualmente, em concurso realizado pela ESAF - Escola de Administração Fazendária -, para ingresso na Receita Federal, o candidato foi instado a traduzir os vocábulos: DIATRIBE, ANÁTEMA e NOVEL.
Procedendo à tradução, ter-se-á: diatribe é o "discurso em que se ataca alguém" ou uma "discussão exaltada". Fala-se, no caso, em uma "diatribe acirrada entre os oponentes". Note que se trata de substantivo feminino: a diatribe (sílaba tônica em -tri).
Anátema, por sua vez, é a "repreensão enérgica". Diz-se, por exemplo, que "o chicote era o anátema da sociedade colonial".
Por fim, novel (oxítona não acentuada, com sílaba tônica em -vel) significa "novo" ou "principiante". Tem-se, por exemplo: "o homem é jovem e, igualmente, novel na fé".
Há poucos meses, em 2006, em extensa prova de português aplicada no concurso para o cargo de Delegado de Polícia Civil, também do Rio Grande do Sul, exigiu-se o conhecimento do vocábulo IDIOSSINCRASIA. A respeitável Banca trouxe a frase: "O comportamento evasivo era uma idiossincrasia daquele sujeito apontado como culpado". A alternativa correta foi a que sinalizava o termo "particularidade". Com efeito, "idiossincrasia", conforme explico em obra de minha autoria - Redação Forense e Elementos da Gramática, Editora Premier, 2ª Edição, p. 459 -, é "a característica comportamental peculiar a um grupo ou a uma pessoa".
Não há dúvida: para passar nos concursos, dominando-se o léxico, há de haver curiosidade e obstinação. É a inafastável idiossincrasia de quem encontra o nome na lista de aprovados...
Eduardo de Morais Sabbag
Advogado, Palestrante e Conferencista. Professor de Língua Portuguesa e Direito Tributário no Curso Prima/IELF, em São Paulo/SP, Professor de Pós Graduação na Universidade Gama Filho, no Rio de Janeiro e no Centro Salesianos em Lorena/SP. Autor das Obras "Elementos de Direito Tributário", " Repertório de Jurisprudência" e " Exames da OAB- Testes e Comentários". Mestrando em Direito Tributário.
www.professorsabbag.com.br.
Jornal Carta Forense, Folha do Acadêmico, Abril 2007, p. F11