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STF restringe uso de algemas a situações excepcionais.

por Daniel Roncaglia

 

 

O uso de algemas viola o princípio constitucional da dignidade humana e por isso elas só devem ser empregadas em casos excepcionais. O posicionamento foi firmado pelo Supremo Tribunal Federal, nesta quinta-feira (7/9). Para os ministros, a pessoa só pode ser algemadas quando houver risco de fuga ou quando ela colocar em risco a segurança dela e de outras pessoas.

O Supremo decidiu ainda editar uma Súmula Vinculante sobre a questão, o que obriga os juizes de todas as instâncias bem como a administração pública a seguir o seu entendimento. Cópias da decisão serão enviadas ao ministro da Justiça, Tarso Genro, e aos 26 secretários de Segurança Pública.

A decisão foi tomada no Habeas Corpus que pediu a anulação do Juri de um reú que permaneceu algemado durante todo o julgamento. Antonio Sérgio da Silva, o réu, condenado pelo Tribunal do Júri de Laranjal Paulista (SP) a 13 anos de prisão por homicídio qualificado. Para o defesa, o uso das algemas durante o julgamento, além de representar constrangimento ilegal, influenciou a decisão dos jurados.

O ministro Marco Aurélio, relator do caso, afirmou que manter um réu algemado durante o julgamento contraria a Constituição. Isso porque é preciso considerar o princípio da não-culpabilidade. “É certo que foi submetida ao veredicto dos jurados pessoa acusada da prática de crime doloso contra a vida, mas que merecia o tratamento devido aos humanos, aos que vivem em um Estado Democrático de Direito”, anotou o ministro.

Para fundamentar o seu entendimento, Marco Aurélio cita diversas garantias constitucionais das pessoas presas como o respeito à integridade física e moral e à informação de seus direitos. Segundo o ministro, esses preceitos repousam no necessário tratamento humanitário do cidadão.

“Manter o acusado em audiência, com algema, sem que demonstrada, ante práticas anteriores, a periculosidade, significa colocar a defesa, antecipadamente, em patamar inferior, não bastasse a situação de todo degradante”, reforçou Marco Aurélio. O ministro lembrou que o julgamento de júri é feito por pessoas leigas, que ao verem o réu algemado podem imaginar que ele é perigoso.

Marco Aurélio cita decisão do próprio Supremo no Habeas Corpus 71.195, relatado pelo ministro aposentado Francisco Rezek em 1995, no qual a 2ª Turma entendeu que as algemas só podem ser usadas em julgamento quando não for possível outros meios. No ano passado, a 1ª Turma tomou decisão no mesmo sentido.

O ministro aproveitou seu voto para fazer um histórico da questão. Em 1821, o príncipe regente Dom Pedro I decretou que “a prisão deve só servir para guardar as pessoas e nunca para as adoecer e flagelar; ficando implicitamente abolido para sempre o uso de correntes, algemas, grilhões e outros quaisquer ferros”. As reformas processuais ao longo da história mantiveram posição parecida.

Segundo Marco Aurélio, até o Direito Penal Militar entende que o uso da algema é excepcional. O artigo 234 do Código de Processo Penal Militar afirma que “o emprego de força só é permitido quando indispensável, no caso de desobediência, resistência ou tentativa de fuga. Se houver resistência da parte de terceiros, poderão ser usados os meios necessários para vencê-la ou para defesa do executor e auxiliares seus, inclusive a prisão do ofensor”.

Se as pessoas nessa situação não podem ser submetidas às algemas, “o que se dirá no tocante àquele que, vindo sob a custódia do Estado há algum tempo, já se encontra fragilizado e comparece ao tribunal para ser julgado?”, questiona o ministro.

Para ele, a falta de uma lei, que prevê a retirada de algemas durante o julgamento, não conduz à possibilidade de manter o réu algemado.

 

“É hora de o Supremo emitir entendimento sobre a matéria, inibindo uma série de abusos notados na atual quadra, tornando clara, até mesmo, a concretude da lei reguladora do instituto do abuso de autoridade, considerado o processo de responsabilidade administrativa, civil e penal, para a qual os olhos em geral têm permanecido cerrados”, anota ministro. (Revista Consultor Jurídico, 7 de agosto de 2008)

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