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Juristas explicam que não há crime na negociação de documentos.

Priscilla Mazenotti / Agência Brasil [21/09/2006]
Jornal O Estado do Paraná
www.parana-online.com.br


Brasília - A investigação da Polícia Federal sobre a negociação de um dossiê que envolveria políticos do PSDB na compra superfaturada de ambulâncias não poderá enquadrar a venda de documentos como crime, segundo juristas. Na avaliação deles, comprar ou vender documentos somente não constitui crime, mas, sim, o objetivo da ação e o uso que seria feito do material.

O presidente da Academia Paulista de Direito Criminal, Romualdo Sanches Filho, disse que a tentativa de venda de documentos não pode ser configurada crime. "A venda de documentos, por si só, não configura crime, mas o objetivo da utilização deles é", disse em entrevista à Agência Brasil.

Para o ex-professor da Universidade de São Paulo (USP), juiz aposentado, ex-promotor e ex-delegado Luiz Flávio Gomes, a operação interrompida pela Polícia Federal foi uma simples operação de compra e venda, já que não se chegou a "exigir nada de ninguém".

"Na verdade, foi compra de documento. Uma compra e venda normal. Da compra e venda de documento é difícil ver crime. Só vai haver crime no momento em que esses documentos, quando alguém começa a fazer extorsão e exigir que alguém te dê dinheiro para você não divulgar", explica.

Quanto à perda do benefício da delação premiada de Vedoin, Luiz Flávio concorda com Romualdo: "Ele não vai conseguir o benefício que certamente obteria se tivesse falado toda a verdade. Ele não está colaborando corretamente com a justiça. Logo, o benefício vai ser, certamente, muito pequeno", disse.

A Polícia Federal prendeu na sexta-feira (15) quatro pessoas relacionadas à negociação de documentos que envolveriam políticos do PSDB com a compra superfaturada de ambulâncias. Entre eles, estavam dois petistas com quase R$ 2 milhões que seriam usados na negociação.

Nos depoimentos, foram citados Freud Godoy, ex-assessor da Presidência, Jorge Lorenzetti, assessor da campanha de Lula, e Oswaldo Bargas, ex-secretário do Ministério do Trabalho. O inquérito é presidido pela Polícia Federal em Cuiabá com autorização da Justiça Federal.

O JÚRI E O JULGAMENTO DO ACUSADO AUSENTE POR SUA OPÇÃO OU REVELIA

A novel Lei n.º 11.689/2008 que alterou o procedimentoespecial do júri, correspondente agora aos arts. 406 usque 497 do CPP, trouxe inúmerasmodificações no seu bojo, algumas de há muito esperadas pelos operadores dodireito que militam na apaixonante seara do júri, e outras que representaram umverdadeiro retrocesso no mecanismo dessa bem mais que secularinstituição.

Foquemos nestas rápidas linhas um dos mais palpitantestemas de grande inovação no atual procedimento bifásico ou escalonado dojúri.

Como sabemos, na sistemática anterior do júri, oacusado que fosse levado a julgamento por crime inafiançável, não importando sedoloso ou não contra o bem jurídico vida (prevalente ou conexo), sua presençaseria imprescindível na data da sessão do júri, sob pena de o julgamento nãoacontecer, conforme dispunha o art. 451, § 1.º, do CPP, enfim, o acusado tinhapor que tinha de comparecer ao julgamento, de que modo fosse, não importava,devendo ser apresentado pela escolta no caso de estar preso ou comparecervoluntariamente se estivesse solto e desde que regularmente intimado para tanto,sucedendo que neste último caso, se a ausência não fosse justificada, poderiaocorrer a decretação da prisão preventiva do acusado se preenchidos osrequisitos legais.

Entrementes, se o crime pelo qual respondesse o acusadofosse afiançável, como, por exemplo, o infanticídio (art. 123 do CP), a ausênciainjustificada do acusado não impedia fosse ele submetido a julgamento pelo júri,mesmo à sua revelia, valendo-nos também da anterior disposição do mesmo art.451, § 1.º, do CPP.

Nada obstante, o crime de maior ocorrência perante otribunal do júri é justamente o homicídio, inafiançável, cuja presença doacusado à sessão do júri, como já visto, era obrigatória, o que gerava, naausência do acusado revel, dois percalços imediatos: 1) suspendia-se o processoaté a apresentação do acusado ou até a extinção de sua punibilidade; 2) alijavaa vítima ou herdeiros de poderem ter à mão um título executivo por danosmateriais e morais contra o causador do delito.

Contudo, a novel lei de regência do júri colocou de vezuma pá de cal sobre essa tormentosa e anterior proibição, certo que a lei agoranão faz qualquer distinção entre crime afiançável ou inafiançável para que oacusado seja julgado pelo júri mesmo na sua ausência, bastando que o acusadopara tanto manifeste, juntamente com o seu defensor, no caso de estar preso, seudesejo de não se fazer presente à sessão do júri, a mesma postura podendo seradotada, é claro, se o acusado estiver solto, podendo nesta última hipótese, aoque nos parece, a manifestação ser feita pelo acusado ou seudefensor.

Dessa forma, temos que agora o tribunal do júri poderájulgar o acusado ausente que tenha antes declinado de seu direito de presença,corolário da autodefesa, independente de ele estar preso ou solto, ou ainda deser o crime afiançável ou não, conclusão que queda inarredável por simplesleitura da nova redação dada ao art. 457 e parágrafos do CPP. No entanto, agrande questão agora seria a de se saber se o tribunal do júri pode julgar oacusado ausente que não tenha sido intimado pessoalmente para isso, por conta dese encontrar ele em local incerto e não sabido ou ainda ter embaraçado asdiligências envidadas para aquela finalidade. A resposta positiva não nos pareceabsurda.

Embora não encontremos na nova lei de forma explícitaessa autorização, é intuitivo que a menslegis desejou seja todo acusado ausente, em razão de se encontrar emparadeiro ignorado, julgado doravante à revelia pelo júri. Tal conseqüência podeser depreendida, entre outros, com a leitura da nova disposição do art. 420,parágrafo único, o qual não repetiu a revogada disposição do art. 414 do CPP quenão permitia a intimação editalícia do acusado pronunciado por crimeinafiançável, o que agora é admitido pela novel lei, ou seja, coroa-se apossibilidade de o processo caminhar para a segunda fase mesmo à revelia doacusado, procedimento que não foi agora adotado de maneira gratuita, mas com ainequívoca finalidade de evitar lá na frente, no plenário do júri, a suspensãodo processo por não localização do acusado para a sessão do júri.

Outro ponto da novel lei que reforça a admissão dojulgamento pelo júri do acusado ausente por revelia é o fato de ele não serintimado na fase da nova disposição do art. 422 do CPP, mas apenas seu defensor(prazo de cinco dias para indicação do rol de testemunhas, juntada de documentose requerimento de diligências), diferentemente da revogada sistemática previstano art. 421, caput, do CPP, quando,além da intimação da defesa, também deveria ser entregue ao acusado uma cópia doagora extinto libelo, sob pena de nulidade absoluta, conforme art. 564, III,“f”, do CPP, o que denotou o desejo do legislador em transferir ao defensor doacusado plena autonomia para deliberar naquele instante acerca de todos ospassos que sejam benéficos ao acusado, dispensando assim a ciência ou presençadeste último. Ora, se o legislador, repise-se, permitiu ao acusado seja elejulgado pelo júri sem a sua presença, por qual motivo lógico, sistemático eteleológico não poderia julgá-lo à revelia?

Dessa forma, pensamos que se foi agora abandonadaqualquer distinção entre crime afiançável ou não no momento de se intimar oacusado da decisão de pronúncia, bem como não foi vedado, como fazia o sistemaanterior, o julgamento do acusado pelo júri à revelia, nomeadamente com relaçãoaos crimes inafiançáveis, não haveria então qualquer impedimento para que oacusado fosse agora submetido a julgamento perante o conselho popular, ainda queesteja ele ausente de forma injustificada.

 

Romualdo Sanches Calvo Filho

Advogado Criminalista e Pós-Graduado em Direito e Processo Penalpelo Mackenzie

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