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“Esse caminho é santo meu rapaz”, disse-me certa feita aquele simpático e generoso carpinteiro português que conheci em abril de 1975, quando fui admitido como auxiliar de carpintaria no extinto cotonifício Guilherme Jorge, situado na Vila Carrão, em São Paulo.
Contava eu com 14 anos de idade e foi meu primeiro emprego registrado. O serviço era duro, uma vez que tinha que carregar nos ombros pesadas madeiras, além de tomar inúmeras pancadas nos dedos ao errar o alvo das cabeças de pregos que martelava, sem contar as advertências nada didáticas e humilhantes de um mestre lacaio que por lá nos chefiava, enorme e pançudo, com ar de vassalagem deplorável, enfim, cara de urso puxa saco! Contudo, esses revezes eram deixados de lado ou mesmo esquecidos, certo que infinitamente compensados com grandes carpinteiros vocacionados, solícitos e bonachões que lá trabalhavam, entre eles, o maior de todos, aquele que me deixa e que nos deixa muita saudade até hoje: o irmão ANTONITO DAS LARANJITAS, como carinhosamente gostava de chamá-lo. Seu nome verdadeiro era Antonio Maria Monteiro, nascido em Trás-os-Montes, em Portugal, a 22/07/1918 e deixando-nos em 28/06/1987, vítima de um acidente hospitalar quando se internou para se submeter a uma cirurgia.
O irmão português era muito temente a Deus e assíduo leitor do maior best-seller de todos os tempos, a Bíblia Sagrada, cujos trechos lia diuturnamente, especialmente antes de se dirigir à carpintaria do Guilherme Jorge todas as manhãs. Vivia para Deus, sua família, amigos e trabalho, com um espírito sempre acolhedor, amável e de conduta acima de qualquer suspeita, semeando com sabedoria a palavra de Deus, uma vez também que dotado do dom de evangelizar, motivo pelo qual também me tornei testemunhado da graça do filho do Homem, a qual nunca mais pude esquecer e a qual anos depois me converti no bairro do Brás.
Desse modo, passados quase 40 anos daquele abril de 1975, as doces memórias do valoroso e doce soldado português de Cristo não se apagaram do meu coração, rendendo-lhe agora uma justa e merecida homenagem, assim como à sua querida família e irmãos na fé, nomeadamente Maria, sua mulher e cuja caridade o tempo não diminuiu, além de seus filhos e amigos Fernando, Paulo, Eduarda, Madalena e Laura, os quais herdaram o maior legado que um homem pode deixar nesta vida aos seus amados: crença inabalável em Deus e no seu filho e salvador Jesus Cristo, patrimônio que o ladrão não leva, traça não corrói e os governos corruptos não destroem.
O meu consolo é que um dia poderemos nos encontrar na eternidade e matar a saudade um do outro, com a vantagem que depois disso nunca mais haverá saudade.
Romualdo Sanches Calvo Filho
Advogado e Presidente da APDCrim
Dezembro/2014